Uma das perguntas mais frequentes que escuto quando falo sobre parto é: dói muito? Ou então: nossa, você pariu sem anestesia? Como aguentou a dor?
Queria abrir este post com uma informação interessante. Vocês sabiam que em algumas tribos africanas a palavra “dor” não existe associada ao parto? Será que as mulheres africanas são tão diferentes de nós, fisiologicamente falando? Não, claro que não. Mas, culturalmente, elas ouviram falar do parto de outra forma.
No mundo ocidental, crescemos ouvindo que parir dói. Então a primeira coisa que podemos fazer é separar dor e sofrimento. Sim, a dor está lá. Eu pari e já dei suporte a dezenas de mulheres parindo. Mas as gestantes que optam por um parto natural, sem intervenções, não estão sofrendo. Estão experimentando sensações muito intensas, que provavelmente nunca sentiram antes. Estão sendo levadas a lugares muito desconhecidos, onde jamais estiveram em outro momento da vida. Mas sem sofrimento. Meu marido, ao dar um relato em uma roda de gestantes e casais sobre nosso parto sem anestesia, foi questionado por um dos homens presentes: mas como foi ver sua esposa sofrer? Ao que ele respondeu sem hesitar: aquilo que eu vi não era sofrimento – era sentimento.
Vivemos a cultura do medo, tomamos remédios para tudo. Estamos despreparados para lidar com ritos de passagem e encarar desafios. E o parto abre uma porta muito grande para nossos medos aparecerem. Medo da morte, medo de não dar conta, medo de ser mãe, medo do desconhecido. O parto é uma oportunidade enorme de crescimento, de aprendizado, de conhecer seus limites e ir além. É uma abertura para o extraordinário!
Sim, a imensa maioria das mulheres vai se surpreender com a intensidade das sensações presentes no parto. Elas vão lidar melhor com essas sensações se tiverem acesso a métodos não farmacológicos para alívio da dor (lembrando que eles não eliminam a dor, mas aliviam). E a dor tem sua função. Uma delas é avisar que um bebê está chegando e que você deve ir para um lugar seguro. Outra função é tirar sua mente consciente do caminho do seu corpo para poder parir.
Lembro que fiz um plano de parto não tradicional para o nascimento do meu segundo filho. Lá não havia muitos desejos, digamos, “técnicos”, como liberdade de movimentos, poder comer e beber, não ter episiotomia. Entretanto, escrevi, com estas palavras: “quero sentir tudo o que tiver direito; quero enlouquecer para parir”. Quando vejo o rosto das mulheres parindo naturalmente, lindas e loucas, lembro desta função da dor e da enxurrada de hormônios presentes no parto. Com uma entrega absoluta às sensações do corpo, sem a mente consciente no meio do caminho para atrapalhar.
Queria citar algumas influências importantes na capacidade da mulher em lidar com a dor: apoio contínuo intraparto e autoeficácia, ou seja, conhecimento do processo e acreditar em si mesma. No parto, a mulher precisa se sentir segura para expressar suas emoções e fazer o que tiver vontade, sem culpa, sem vergonha, sem julgamento, sem medo – para que possa viver a experiência de parto e nascimento do seu jeito, que é próprio e único.
Em relação ao apoio contínuo intraparto, já está provado que a presença de uma pessoa treinada (doula) que apoia física e emocionalmente a mulher durante o trabalho de parto tem muitos benefícios. Um estudo feito em 2017, com 27 ensaios, incluindo mais de 15.500 mulheres, descobriu que a presença contínua de uma pessoa de suporte (que não fosse do grupo familiar ou da equipe médica) reduzia a probabilidade de medicação para alívio da dor, parto vaginal cirúrgico e cesárea, e aumentava a satisfação com a experiência de nascimento.
Então…pode ser que você sinta dor. Mas a forma como vai encarar a dor fará toda a diferença! Lembre-se de que as contrações são bem-vindas, porque são elas que vão trazer seu bebê para o seu colo. Viver o processo é algo realmente transformador e arrebatador. Por fim, queria terminar com uma frase que ouço de tantas mulheres que tive o prazer e a honra de acompanhar: se eu fui capaz de parir, sou capaz de tudo!
Crédito da foto: Thais Thomazzoni