Desde minha juventude me interessei sobre questões existenciais, mas isso cresceu quando minha mãe (jornalista) fez uma matéria sobre partos e abordou a cesárea, o normal e o natural. Achei interessante. Algum tempo depois assisti o documentário Renascimento do Parto e fiquei encantada pelo assunto. Eu, que tenho pavor de agulha, vi uma alternativa respeitosa à comum cesárea. Então estudei bastante e tudo fez mais do que sentido, somos animais acima de tudo, e a natureza é sábia.
Em 2015 engravidei. Como já queria, eu tinha uma ginecologista obstetra que dizia fazer o natural. Com o passar das consultas do pré-natal, e algumas perguntas chave feitas por mim e pelo meu marido, vimos que algo estava estranho. Depois de mais pesquisas, soube que ela costumava fazer mais cesáreas que o recomendado e era intervencionista. Por fim cheguei à Dra. Andrea Campos, obstetra humanizada, com seis meses de gestação.
Em seguida, após encontros com doulas, conheci a Carla Dieguez e fechamos a doulagem!
Fiz epi-no e massagens perineais em casa depois de aprender como com a fisioterapeuta. Não cheguei ao máximo.
Por já estar com 40s3d, bebê acima de 4kg e líquido amniótico aumentado, a Dra Andrea fez descolamento de membranas e eu fiz acupuntura. Ambos tentando que meu trabalho de parto entrasse na fase ativa (eu já estava com contrações havia uns dias mas não estavam ritmadas). Não adiantou. Com 40s6d, me internei na maternidade, encontrei a obstetriz Priscila Raspantini (que alternava as consultas com a obstetra), onde induzimos com ocitocina e, quando estava com 3 contrações num intervalo de 10min, estouramos a bolsa para tentar ajudar o parto e tirar a ocitocina. Isso já eram umas 16h e só então eu comecei a sentir as contrações de verdade. Meu marido e minha mãe estavam comigo, além da doula, obstetriz e obstetra.
A partir de então, senti muita dor. A Priscila tirou a ocitocina e meu corpo agiu sozinho até o fim. A sensação mais forte era nas costas. Transitei entre chuveiro, banheira, cama, bola suíça, banqueta, mas onde mais fiquei foi na banheira e no chuveiro. A água quente parece ter uma função mais relaxante. Tive liberdade para testar posições que mais me aliviavam – ou menos doíam -, até pedi pra colocarem os travesseiros dentro da banheira e fui atendida! A Carla me oferecia constantemente comida e líquidos, mas confesso que não conseguia comer direito. Tentamos músicas que eu tinha baixado, mas o melhor mesmo era o silêncio (engraçado como muita coisa que planejamos não funciona na hora para nós mesmas. Acho que é um paralelo interessante o trabalho de parto com a maternidade: aceitar que nem tudo sai como queremos e que está tudo bem!).
Quando eu pedia para saber a quantas andava minha dilatação, a obstetra via e me falava. A obstetriz checava de tempos em tempos os batimentos do meu bebê. Meu marido não saiu do meu lado, me deu muita força e apoio – a Carla o chamou de doulo =). Ela e minha mãe revezavam nas massagens – quando eu as aceitava. Minha mãe, mesmo aflita e preocupada com a dor que eu sentia, me deu um suporte amoroso que só mãe mesmo para dar. Não tive noção de horário, do entorno, de nada. Pedi anestesia, sim, durante duas contrações, mas quando elas passavam, eu pensava que aguentaria mais 20 minutos, e se aguentava 20, aguentaria 30 e assim por diante.
Quando senti vontade de fazer força, avisei a médica. Eu estava com 9,5cm, ela falou que poderia ajudar segurando o colo na próxima contração, assim a cabeça do bebê iria pra baixo e o colo ficaria. Aceitei. Não senti nada de diferente, foi ótimo.
Então estava eu na banqueta, de cócoras, meu marido atrás de mim, me dando apoio e suas mãos para eu apertar, a Dra Andrea na minha frente, sentada no chão, com um espelho no colo (assim meu marido e eu assistiríamos o nascimento do nosso filho), a Priscila ao meu lado, a Carla em pé ao meu lado também, e minha mãe na minha frente. Com as luzes apagadas, eu fazia força quando sentia vontade (a cada contração), uma força imensa, focada, direcionada. Quanto mais longas, melhor eram, mas dependia do fôlego que eu tomava antes. A 01:53am meu Ben nasceu. Foram por volta de dez horas de trabalho de parto com contrações fortes. Te digo que não vi passar esse tempo todo, aliás, não sabia se tinham passado cinco minutos ou 24 horas. A sensação que tenho hoje é que eu saí de mim, entrei em transe. Certa vez li que, no trabalho de parto, a mulher sai de seu corpo, vai até as estrelas buscar a alma de seu bebê, e volta com ele. Achei lindo e pra mim fez total sentido.
Ele nasceu e veio direto para o meu colo, e ficou olhando bem atento para mim e para o meu marido. Um dos momentos mais especiais da minha vida, se não o mais.
Após o nascimento dele, não senti absolutamente nada de incômodo ou dor. Depois de o cortão ser cortado, levantei e fui para a cama esperar a placenta sair. Levantei e fui tomar banho. O Ben não saiu nem um minuto de perto da gente, até quiseram levá-lo para o berçário, mas não deixamos. Meu marido não autorizou nada, nem que o levassem para o quarto que iríamos, sem um de nós. Já tínhamos conversado e combinado tudo – detalhe importante: combine tudo antes com seu (sua) companheiro(a), ele (a) será seu representante, seu advogado, quando 1- você estiver em transe no TP, e 2- quando estiver ‘ocitocinada’ achando tudo lindo. =D.
O Ben veio mamar em seguida e ficamos juntinhos até hoje.
Esse parto veio para me ensinar algumas coisas, entre elas:
– informação é ouro.
– bebê com mais de 4kgs podem nascer de parto normal sim – Ben nasceu com 4,135kg de 41 semanas completas, de parto natural, sem laceração! (Apesar do médico do laboratório no ultrassom de 41s ter dito que se não fosse cesárea, teriam que tirá-lo com fórceps e eu não aguentaria).
– nem tudo acontece como previmos. Nem melhor, nem pior. Simplesmente diferente.
– é um momento que eu me lembro todos os dias – sem exceção.
-jamais palavras explicarão as sensações, os sentimentos e as lembranças daquele dia.
– eu tenho digerido um pouco por dia. Quando quero falar sobre isso, ou tirar dúvidas, falo com meu marido, ligo pra minha mãe, troco mensagens com a Carla e vou tomar um chá com a Priscila.
– apoio é fundamental. Tanto no parto quanto na amamentação (assunto pra uma próxima).
– você deve escolher uma equipe na qual confie.
– você deve confiar, principalmente, em você. Como me disse a Carla: mulheres sabem parir, bebês sabem nascer.